A
Espiritualidade que Brota da Terra e Inspira o Coração
Por
Hiran de Melo
A canção “Súplica Cearense”,
eternizada na voz de Luiz Gonzaga, é mais do que um lamento pela seca — é uma
oração que nasce do chão rachado, do coração ferido, da alma que ainda espera.
Em cada verso, o homem nordestino se revela em sua vulnerabilidade diante da
natureza, em sua humildade diante do divino, e em sua força diante da dor. É
uma espiritualidade que não se aprende nos livros, mas se vive com os pés
descalços sobre a terra quente.
Ao pedir que o sol “se
esconda um tiquinho” e que a chuva venha “de mansinho”, o eu lírico não clama
por milagres grandiosos, mas por equilíbrio. Ele não exige, ele pede. E nesse
gesto há uma sabedoria profunda: o desejo não é por extremos, mas por harmonia.
A oração não é uma fórmula perfeita, mas uma entrega sincera — como nos ensina
Jean-Yves Leloup, o que importa não é a eloquência, mas a verdade que brota do
coração.
Esse homem simples, que “não
sabe fazer oração”, é, na verdade, um místico do cotidiano. Ele habita
poeticamente o mundo, como diria Martin Heidegger, mesmo em meio ao sofrimento.
Sua súplica é uma escuta do silêncio do céu, uma abertura ao mistério do ser.
Ao encher os olhos de água, ele revela que a oração também é feita de lágrimas
— e essas lágrimas são força, são vínculo com o sagrado, são o sal da terra.
A seca que castiga o Ceará é
mais do que ausência de chuva: é metáfora de um mundo que arde, mas que ainda
pode florescer. A súplica se transforma, então, em convite. Um chamado para que
cada um de nós reconheça a dor do outro, respeite sua religiosidade, e escute a
voz da espiritualidade que habita o coração. Que sejamos, com nosso exemplo de
vida, fonte de esperança, luz no caminho, inspiração para quem ainda espera
pela chuva — não só no chão, mas na alma.
Transformar-se é acolher. É
saber que mesmo a oração imperfeita, dita com mágoa, pode tocar o Mistério. É
viver com coragem, com compaixão, com fé. Que a súplica do sertanejo nos ensine
a sermos mais humanos, mais atentos, mais abertos. Que ela nos inspire a sermos
chuva mansa na vida de alguém.
Assista o vídeo:
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