Adoção de animal e de bebê reborn - o que há em comum e o que as diferencia?

 

Por Hiran de Melo

 

A comparação entre adotar um animal de estimação e "adotar" um bebê reborn — aquelas bonecas super-realistas que parecem bebês de verdade — pode parecer curiosa, mas revela pontos importantes sobre o ser humano e suas necessidades afetivas. Ambas as experiências envolvem cuidado, carinho e a busca por vínculos, mas também têm diferenças essenciais, principalmente quando falamos de realidade, responsabilidade e saúde emocional. Vamos explorar esses dois lados:

 

O que há em comum

 

1. Companhia e afeto


Tanto quem adota um pet quanto quem se apega a um bebê reborn está, de alguma forma, buscando acolhimento emocional. Em momentos de solidão, luto ou fragilidade, esses "seres" — reais ou simbólicos — preenchem um vazio, trazendo algum conforto ou sensação de presença.

 

2. Cuidar como forma de vínculo


Nos dois casos, existe um ritual de cuidado: dar nome, montar enxoval (roupinhas, acessórios, etc.), criar rotina e até conversar. Mesmo que em intensidades diferentes, esse cuidado ajuda a construir uma sensação de conexão e propósito.

 

3. Projeção emocional


Quem adota — seja um cachorro, um gato ou um bebê reborn — acaba projetando sentimentos, desejos e até traumas nesse outro. Isso pode ter um efeito terapêutico, mas, se exagerado, pode também distorcer a percepção da realidade.

 

As diferenças que fazem toda a diferença

 

1. O que está sendo adotado, afinal?

 

Animal: é um ser vivo, com sentimentos, necessidades reais e capacidade de interação. Precisa de comida, atenção, cuidados com a saúde e responde ao afeto que recebe.

 

Bebê reborn: é uma boneca, um objeto inanimado, por mais realista que seja. Não reage, não sente, não exige nada — todas as respostas vêm apenas da imaginação de quem cuida. Claro, por enquanto. 

 

2. Relação real x simbólica

 

Um animal cria vínculos autênticos com o ser humano. Ele retribui carinho, expressa emoções e até muda nosso humor. Já o bebê reborn representa uma relação simbólica — tudo o que se vivencia ali é unilateral, vindo apenas de quem interage com o boneco.

 

3. Quando a fantasia toma conta


O risco maior está em confundir fantasia com realidade. Existem casos em que pessoas tratam os bebês reborn como filhos de verdade — levando ao médico, pedindo licença-maternidade ou querendo prioridade em filas. Esse tipo de apego excessivo pode indicar fugas emocionais perigosas.

 

Com animais, isso raramente acontece, pois as diferenças entre humano e bicho são mais claras e aceitas socialmente.

 

4. Como a sociedade enxerga cada caso


Animais são reconhecidos por lei como seres sencientes, com direitos e proteção. Existem regras para adoção, cuidados obrigatórios e punições por maus-tratos. Já o bebê reborn é apenas um objeto. Quando ele começa a ser tratado como sujeito de direito, isso levanta questões éticas, sociais e até psiquiátricas.

 

Em resumo

 

Tanto quem adota um animal quanto quem se apega a um bebê reborn está, no fundo, tentando viver o afeto, o cuidado e o vínculo — aspectos essenciais da natureza humana. Mas há um ponto-chave:

 

O animal proporciona um vínculo real, vivo, que nos coloca em relação com o mundo como ele é.

 

O bebê reborn oferece uma simulação — uma experiência emocional que, se ultrapassa o limite do simbólico, pode nos afastar da realidade.

 

Como diria Heidegger, quando preferimos viver no conforto do que é fabricado e previsível, deixamos de nos abrir ao mistério e à verdade do ser. E isso pode nos alienar — afastar-nos da vida como ela realmente é.

 

Por isso, o mais importante não é o que se adota, mas como e por que se cria esse vínculo. A linha entre o terapêutico e o problemático está na intensidade da ilusão e na capacidade de reconhecer a diferença entre símbolo e realidade.

 

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